segunda-feira, 24 de dezembro de 2018

A dor próxima de um desconhecido


Ana Paula Morato Damasceno


por Marcos Cesário

Cresci te vendo crescer nas ruas da cidade onde eu também crescia e, desde sempre, te achei linda. Te via sempre de longe e das poucas vezes que te vi de perto, fingi que te olhava de longe. Mas eu, sempre que podia, te olhava com atenção e com uma certa admiração.
O que eu admirava em você? Não sei exatamente. Eu imaginava você pela sua forma simples de caminhar na rua. Admirava sua forma de olhar sem encarar. Admirava a ausência de sua voz que nunca ouvi. Não sei dizer. Não sei...
E, agora, agora mesmo, acabo de saber que você morreu, esta madrugada, em um trágico acidente de carro. E me vem esta tristeza sincera pelas palavras que nunca lhe disse, pelo olhar que nunca lhe ofereci de perto. Não sei quem era você de verdade. E quem sabe quem é quem de verdade? Acho que ninguém... Mas lamento a morte de quem imaginei ouvir, olhar, conhecer de perto. Agora lamento, tanto, não ter deixado você ver o quanto eu te olhava.
Querida, estou sentindo sua morte. Não sei dizer, muito bem, como e onde estou sentindo sua morte. Mas espero que aceite esta dor estranha de um próximo e triste desconhecido.


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