Mais uma manhã de rigoroso
inverno, dirigi-me ao Setor do Governo do Quebéc, em Montreal, que encaminha o
processo de Carteira de Seguro de Saúde,
indispensável para que se consiga atendimento médico na Província. Lá estivera
ao lado de migrantes de todos os continentes, a procura do indispensável
documento, mas não imaginava que ao sair dali receberia uma aula de
generosidade e de solidariedade de um jovem negro, em uma chocolateria.
Atraído pelo reclame, afixado
ao vidro, de que ali se servia um “savoureux chocolat chaud belge”, ou, traduzindo,
“um saboroso chocolate quente belga”, cedi
a tentação. Uma jovem negra no pequeno balcão, ao lado um alto jovem
negro que, pelo sotaque em seu francês, denunciava a sua origem Haitiana. Ao
saber o preço de um pequeno copo do ambicionado chocolate quente, recuei.
Julgava caro demais pagar por um pequeno copo três dolares e setenta e cinco centavos, pedi
desculpas e me retirava, quando fui surpreendido pelo jovem negro. Este se
dirigiu a mim, dizendo:
- “Senhor, tome o chocolate. Quanto o senhor tem? Eu irei lhe
ajudar...” e colocou sobre o balcão dois dólares e cinquenta centavos.
Meio sem jeito, e evitando dizer-lhe que havia uns dólares
também em moeda no bolso do grosso casaco de frio, e ao mesmo tempo sem querer
decepcioná-lo em sua demonstração de solidariedade, tão rara por essas bandas,
completei o valor da agora obrigatória bebida. A atendente, talvez tocada pela
ação magnânima do amigo, encheu um copo grande e me entregou sorrindo. Mas o
mais importante ainda estava por vir. O mesmo jovem me disse, em um francês de
fácil compreensão: “Faça o mesmo mais
adiante”.
Após agradecer-lhe, mais pelo gesto de solidariedade e pela
emocionante lição, que pelo líquido a aquecer-me as mãos, andei algumas quadras
sorvendo lentamente o, na verdade, “saboroso chocolate quente belga”. Mais
saboroso do que o imaginara, já que trazia em cada gota o soberano e nobre
gesto de um desconhecido irmão.
Montreal, 14 de janeiro de 2014
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