O advogado mineiro Rodrigo da Cunha Pereira, presidente do
Instituto Brasileiro do Direito de Família (IBDFAM) publicou no mês passado
(maio/2015), na Revista Eletrônica Consultor Jurídico, interessante artigo em
que aborda detalhes do CONTRATO DE NAMORO, estabelecendo a diferença em relação
a UNIÃO ESTÁVEL.
Por conta dessa frágil diferença é que grande parte dos
processo levados ao tribunais brasileiros envolvendo UNIÃO ESTÁVEL – observa
doutor Rodrigo – “o centro da discussão
está na dificuldade de se diferenciar NAMORO de UNIÃO ESTÁVEL”, porque o
NAMORO é considerado o relacionamento entre duas pessoas sem caracterizar uma
entidade familiar.
Para o Ministro Marco Aurélio Bellizze, do Superior Tribunal
de Justiça (STJ), o relacionamento caracterizado como UNIÃO ESTÁVEL “precisa ter como objetivo a constituição
de uma família”, o que diferencia do NAMORO, que pode se caracterizar como
NAMORO QUALIFICADO, bastante parecido com a UNIÃO ESTÁVEL.
É que no relacionamento de UNIÃO ESTÁVEL o casal está
determinado a constituir uma família, residindo sob o mesmo teto,
compartilhando a manutenção do lar, gerando filhos, construindo patrimônio
juntos, enquanto no relacionamento de NAMORO, com ou sem CONTRATO, o casal
apenas divide o mesmo ambiente de morada, mas tendo cada um seus objetivos
individuais, sem a intenção de formar uma família.
Exemplo desse NAMORO QUALIFICADO ocorreu numa ação que chegou
ao julgamento da 3ª Turma do STJ, no mês de maio último (Processo
nº0000075-22.2015.5.07.0025), quando a mulher ajuizou ação de divórcio, pedindo
o reconhecimento de UNIÃO ESTÁVEL dos dois anos de NAMORO em que se relacionou
com o marido, antes do casamento, pedindo, inclusive, a partilha dos bens
adquiridos pelo marido, enquanto namoravam e residiram sob o mesmo teto, fora
do Brasil.
Explicando: de acordo com o processo, quando namoravam, o homem
foi trabalhar em outro país e meses depois, no período compreendido entre
janeiro de 2004 e agosto de 2005, a namorada foi morar com ele, com a intenção
de fazer curso de inglês, permanecendo mais tempo do que o previsto para o
curso, ocasião em que o casal ficou noivo em outubro de 2004 e com recursos
próprios o homem adquiriu um apartamento no Brasil, no qual os dois foram
morar, acontecendo o casamento, em comunhão parcial, em setembro de 2006.
A mulher alegou no processo judicial que o período compreendido
entre janeiro de 2004 e setembro de 2006, quando oficializaram o casamento, foi
de UNIÃO ESTÁVEL e não apenas de NAMORO, razão porque, além de pedir o
reconhecimento de UNIÃO ESTÁVEL desse período antecedente ao casamento, pediu
também a divisão do apartamento comprado pelo marido, durante a relação de
namoro e noivado.
A mulher obteve sentença favorável em primeira instância e o
homem ingressou com recurso de apelação no Tribunal de Justiça do seu Estado
(Rio de Janeiro), conseguindo obter êxito por decisão da maioria da Turma
Julgadora, o que levou a mulher a interpor embargos infringentes (cabíveis
quando a decisão não é unânime) e obteve do próprio TJ/RJ o direito a um terço
do apartamento, em vez de metade, como queria, decisão que levou o homem a
recorrer ao STJ.
No STJ, o Ministro Bellizze, relator do caso, concluiu que
não existiu UNIÃO ESTÁVEL, mas “NAMORO QUALIFICADO”, porque A FORMAÇÃO DO
NÚCLEO FAMILIAR, com irrestrito apoio moral e material, segundo o ministro,
“tem de ser caracterizada e não só
planejada, para que configure a UNIÃO ESTÁVEL”.
No seu voto, o Ministro Bellizze acrescentou que a coabitação
por si só não “evidencia a constituição
de UNIÃO ESTÁVEL”, porque as partes, nesse caso, “por contingências e interesses particulares (ele, a trabalho; ela por
estudo), foram em momentos distintos, para o exterior e, como namorados que
eram, não hesitaram em residir conjuntamente”.
No entendimento do doutor Rodrigo, o NAMORO pode ser a
preparação para constituição de uma família futura, enquanto na UNIÃO ESTÁVEL,
a família já existe, destacando que “o
que distingue esses dois institutos é o animus
familiae, reconhecido pelas partes e pela sociedade”.
Observa o presidente do IBDFAM, que existem NAMOROS LONGOS
que nunca se transformaram em entidade familiar e RELACIONAMENTOS CURTOS que
logo se caracterizam como UNIÃO ESTÁVEL e mesmo quando há filhos, podem surgir
durante o NAMORO ou durante a UNIÃO ESTÁVEL.
Lembra o doutor Rodrigo que por si só o NAMORO não tem
consequências jurídicas, porque não acarreta partilha de bens ou qualquer
aplicação de regime de bens, fixação de alimentos ou direito sucessório, sendo
exemplo a situação de um casal de namorados que adquire juntos um veículo e com
o fim do relacionamento este bem poderá ser dividido, se não houver contrato
escrito entre eles, de acordo com as regras do direito obrigacional, podendo se
dizer, então que é possível haver uma “SOCIEDADE
DE FATO” dentro de um namoro, sem que isso caracterize uma entidade
familiar.
Logo, por não se tratar de ENTIDADE FAMILIAR, as questões
relativas ao NAMORO, como danos causados à pessoa, são discutidas no campo do
direito comercial ou obrigacional.
O que realmente interessa ao Direito de Família, como adverte
o presidente do IBDFAM “é delinear um
conceito de NAMORO para distingui-lo da UNIÃO ESTÁVEL”, citando o caso de um casal que namorou mais de 50 anos, o que
define que o NAMORO não tem prazo de validade.
É de se levar em conta que antigamente, se o casal não
mantinha relação sexual eram apenas NAMORADOS e se mantinha já se dizia que
eram “amigados”
ou “amasiados”,
sendo, na atualidade, natural e saudável que casais de namorados mantenham
relacionamento sexual, sem que isso signifique nada além de um namoro, e sem
nenhuma consequência jurídica.
Sem dúvida o NAMORO pode ser indício de prova para algumas
situações jurídicas, como no caso de uma negativa de realização de exame de
DNA, que somado ao namoro pode acarretar na declaração de suposta paternidade,
podendo, também, servir para indicar o “fumus boni iuris” (que significa sinal de bom direito ou aparência
de bom direito) exigido à
antecipação de tutela no pedido de alimentos gravídicos (Lei 11.804/2008),
sendo aplicável, também, a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006) nos casos de
namoro.
Observa-se que nessas relações (NAMORO e UNIÃO
ESTÁVEL) há uma grande diferença entre a forma de se ver ou nomear tal relação,
porque entre os homens é comum enxergar ou entender que certa relação se trata
apenas de um namoro, enquanto as mulheres, talvez por serem mais comprometidas
com o amor, veem como UNIÃO ESTÁVEL.
Por esse ângulo de visão diferente soma-se a falta de um
delineamento mais preciso sobre o NAMORO e UNIÃO ESTÁVEL, tem levado os casais
que rompem o relacionamento afetivo às barras dos tribunais, para que o juiz
diga se é uma coisa ou outra, verificando-se que esses casos aumentaram
principalmente após o advento da Lei 9.278/1996, que acertadamente abriu o
conceito de UNIÃO ESTÁVEL, ou seja, retirou o prazo de cinco anos estabelecidos
na Lei 8.971/1994.
Morar juntos quando namorados, não significa, por si só, que
está caracterizada a UNIÃO ESTÁVEL, como ocorreu no caso julgado recentemente
pelo STJ, citado acima, com destaque no voto dado pelo relator, o Ministro
Bellizze, mesmo o casal tendo residido no mesmo apartamento, o que ocorreu por
questões de economia e não com o ânimo de constituir família.
É comum alguns casais, (notadamente aqueles que já
constituíram outra família anteriormente, para evitar futuros aborrecimentos ou
ações judiciais em razão da confusão desses dois conceitos), formalizarem um
CONTRATO DE NAMORO, ou uma DECLARAÇÃO DE NAMORO, dizendo que a relação entre as
partes é apenas um NAMORO e que não têm
a intenção ou objetivo de constituírem uma família, ressaltando-se que, se
a realidade da vida descaracterizar o namoro, elevando-o ao status
de UNIÃO ESTÁVEL, fica desde já assegurado no contrato, ou declaração, qual
será o regime de bens entre eles.
Segundo o doutor Rodrigo da Cunha Pereira, embora o CONTRATO
DE NAMORO “possa parecer o ANTI-NAMORO,
muitos casais, em busca de uma segurança jurídica, e para evitar que a relação
equivocadamente seja tida como UNIÃO ESTÁVEL, desviando assim o animus dos namorados, têm optado por imprimir
esta formalidade à relação”
Concluindo as suas considerações sobre CONTRATO DE NAMORO e
UNIÃO ESTÁVEL, o presidente do IBDFAM
afirma que, apesar da polêmica em torno da validade e eficácia jurídica
do CONTRATO DE NAMORO, “ele pode ser um bom instrumento
jurídico para ajudar os casais a namorarem em paz”
*Maraísa Santana é especializada em Direito de Família, integrante do Escritório
SANTANA ADVOCACIA, com UNIDADES em Senhor do Bonfim (Ba) e Salvador (Ba).
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