quinta-feira, 25 de junho de 2015

A GUERRA DE ESPADAS E O “QUASE FIM DO MUNDO”

Guerra de espadas

Paulo Machado










Desde que comecei a me entender como gente, em Senhor do Bonfim, em minhas moradas e estadias pelo Campo do Gado, Bandeira,  Pernambuquinho, Costa Pinto e Cotegipe, ao imaginar e ver a “Guerra de Espadas”, sempre me veio à mente o alerta de Jesus Cristo a seus apóstolos, alerta que os deixava com certeza atentos e hesitantes entre o medo e a curiosidade“Vigiai, pois, porque não sabeis quando virá o senhor da casa; se à tarde, se à meia-noite, se ao cantar do galo, se pela manhã, Para que, vindo de improviso, não vos ache dormindo. E as coisas que vos digo, digo-as a todos: Vigiai”.(*Marcos 13:34-37).

Mesmo nos dias de hoie, não há como, no dia 23 de junho, véspera do grande dia da Festa de São João Batista, não retornar a essas palavras de Jesus quando circulo pela Vila Nova da Rainha, sobretudo a partir das quinze horas. Claro que tudo vem desde o nascer do sol, em câmara lenta: desde o esfregar de olhos matinal que a cidade procura esconder o seu nervosismo, comprando milhos em carros e lonas abarrotados;  adquirindo amendoim em mil pontos que se multiplicam a cada esquina e a cada metro; entrando nervosamente nos bancos, como se o dinheiro dos caixas eletrônicos estivessem prestes a serem engolidos por alguma força misteriosa. Até mesmo na feira, e nos supermercados, as longas conversas ao pé das bancas e gôndolas quase não existem, as pessoas se apressam como se alguém estivesse a lhes dizer: “já estamos fechando!”. Isto sem falarmos nas sempre novas placas de compensado que protegem vidraças e fachadas de bancos e casas comerciais.

Mas é a partir das quinze e dezesseis horas que a vida corre, escapa rapidamente de pernas e rodas, casas comerciais cerram suas portas, e todo mundo dá a impressão de estar correndo, para suas casas, aliás, para os seus “bunkers”, que passam a ser refúgios e esconderijos até o final da delirante guerra de espadas. Coisa de vinte e duas ou vinte e três horas.

Pedro Amorim e Padre Walter Francisco de Souza, hoje gozando da companhia viva do santo homenageado, não imaginavam que, ao iniciar aquela guerra de ida e vinda de espadas, da parte de cima para a parte de baixo da Praça da Catedral, e vice-versa, estavam instaurando, definitivamente em Senhor do Bonfim, um “frisson”, um “clima”, “uma expectativa” que cresceria em escala geométrica, por herança ou coisa que o valha, até a milésima geração. A partir daquele momento se estava plantando em nossa terra a semente do “nervoso medo”, de uma “guerra inaudita”,  acompanhada de delírios e imaginários, que somente os iniciados, os espadeiros, vestidos a caráter, têm o direito de saborear até a exaustão, enquanto nós, os neófitos, espreitamos o espetáculo  por gretas e venezianas de nossas casas.

Em minha mente ainda menina, desfilam Salomé com a cabeça de João Batista em uma bandeja, ao som de uma  nervosa dança  oriental, enquanto as palavras bíblicas recriam o cenário do quase fim de mundo: 13 Vigiai, pois, porque não sabeis o dia nem a hora em que o Filho do homem há de vir.” (Mateus 25, 13).

 Ao menos, é claro,  até que a Guerra termine, e saiamos catando os bambus jogados a cada esquina, e recuperando ao som e ao ritmo do belo Bloco Caroá,  o Paraíso quase perdido...
Paulo Machado
Senhor do Bonfim, 23 de junho de 2015


PAULO BATISTA MACHADO, Ph.D em Educação
Professor universitário - orientação de trabalhos científicos
Possui graduação em Filosofia pela Universidade Federal de São João Del-Rei (1976), graduação em Teologia pela Escola Teológica da Congregação Beneditina Brasileira (1972), graduação em História pela Universidade Católica do Salvador (1986), mestrado em Educação pela Universidade Federal da Bahia (1990) e doutorado em Educação (Ph D) - Université Du Quebec à Montreal (1998). Pos-doutor em Educação pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), desde dezembro de 2013 faz estagio Pos-Doutoral no CRIFPE, da Universidade de Montreal, Canadá. .Aposentou-se em 2009 como professor Pleno da Universidade do Estado da Bahia, Atuou também como professor titular do Instituto Superior de Teologia e Pastoral de Bonfim e prefeito da Prefeitura Municipal de Senhor do Bonfim. Fundou e coordenou o Grupo de pesquisa "Representações Sociais, Imaginário e Educação Contemporânea",  do Departamento de Educação do Campus VII, Universidade do Estado da Bahia, Senhor do Bonfim. É líder dos Grupos de Pesquisa certificados junto ao CNPQ chamado GEFASSCE da Universidade de Pernambuco (Petrolina) , Representações Sociais, Imaginário e Educação Contemporânea (GRUNEB) da Universidade do Estado da Bahia (Campus VII – Senhor do Bonfim-Ba) e pesquisador do grupo FORMACCE em aberto da Universidade Federal da Bahia. É consultor da Capes, do CNPQ e do Instituto Mackenzie. . Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Formação de Professores, atuando principalmente nos seguintes temas: representações sociais, escola pública, pesquisa em educação. Orientador de TCCs, Dissertações e Teses, possui experiência em pesquisa e orientação de pesquisa. Exerce o magistério superior na Faculdade Augusto Galvão, Campo Formoso, Bahia, e é Professor Visitante da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Departamento de Educação, Campus VII, Senhor do Bonfim, Bahia.

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